A 1ª. ponte (ligação) ferroviária sobre o Tejo nacional

Houve, num tempo que já lá vai, entre Constância e Paio de Pelle - atual Praia do Ribatejo - uma ponte ferroviária que foi a primeira sobre o Tejo nacional. Esta é a história da ponte que houve, mas também da que há...

ENQUADRAMENTO HISTÓRICO:
As Invasões Francesas com a consequente fuga da Corte para o Brasil (1) - onde permaneceu 13 longos anos - de que resultou a orfandade política do estado, as Guerras Liberais (2) desencadeadas por disputas de poder que criaram cisões sociais e milhares de mortos, e os diversos movimentos populares ditados pelo descontentamento e pelas desigualdades sentidas, de que se destacam a Revolução da Maria da Fonte (3) e também a Patuleia (4) - com contornos de guerra civil -, definiram a primeira metade do séc. XIX, pelo que, com um saldo de realizações que não abonava a seu favor nem a favor das suas gentes, Portugal encarava agora a segunda metade do séc. XIX como uma nova era de oportunidades.Desde logo com o desígnio nacional da realização de grandes obras públicas centradas na melhoria das vias de comunicação, com a implantação em larga escala do caminho-de-ferro. Para isso é criado por Fontes Pereira de Melo, ministro do reino, a 30 de agosto de 1852, o Ministério das Obras Públicas que seria ainda responsável pela criação do estudo da Indústria e da Agricultura em Portugal, para o que fundou o Instituto da Indústria e o Instituto da Agricultura.
O SONHO DE UM REI

D. Pedro V é um rei jovem - a mãe, a rainha D. Maria II morre a dar à luz o seu 11º filho (nascido nado morto), tinha ele 16 anos; menor portanto para assumir o trono, pelo que o reino fica entregue ao pai, Fernando de Saxe-Coburgo-Gota-Koháry, o rei alemão, também conhecido como o Rei Artista, por ter sido o responsável pela construção do Palácio da Pena, em Sintra e pela plantação de inúmeras espécies exóticas nas suas encostas.

Em 16 de Setembro de 1855, ao concluir 18 anos é aclamado rei, sentindo, então em plenas funções de governação, chegada a hora de implementar aqueles que eram de algum tempo a esta parte os seus projetos de desenvolvimento para um país que considerava endemicamente em crise. Sobretudo quando comparado com outros países europeus, como França, Reino Unido e Alemanha, entre outros por ele visitados nos anos anteriores à sua ascensão ao trono e de que chegou embebido de novas ideias e impressionado pelos níveis de desenvolvimento alcançados.

Em plena revolução industrial, a maioria dos países do norte da Europa contavam já com a máquina a vapor nas suas múltiplas utilizações: fabris, empregues na agricultura e como força de tração, de que o melhor exemplo era o comboio. Com o caminho-de-ferro a expandir-se pela Europa e já do lado de lá do Atlântico, não faltavam os que em Portugal desejavam poder auferir das vantagens deste novo motor de desenvolvimento.

Não obstante, não foram fáceis os primeiros passos do caminho-de-ferro entre nós.

Mas D. Pedro V estava determinado em levar avante os seus desígnios.

É incumbido de conduzir o projeto ferroviário, Fontes Pereira de Melo, o seu ministro das obras públicas, que recorre à primeira empresa ferroviária portuguesa, constituída pelo empresário britânico Hardy Hislop em 1853 (extinta em 1857) mais conhecida como Companhia Peninsular, mas cujo extenso nome era na verdade Companhia Central Peninsular dos Caminhos de Ferro de Portugal. No entanto fruto das inúmeras dificuldades associadas, desde logo pela dimensão e custos das obras, mas também pelas múltiplas resistências que gerou, este projeto depressa marcou passo.

Foi com um novo impulso dado em 1860, com a criação da Companhia Real dos Caminhos de Ferro Portugueses que as obras seriam retomadas...Prosseguindo a ligação suspensa de Lisboa ao Carregado, inaugurada em 28 de outubro de 1856 a nova companhia, é responsável pelo lançamento de dois grandes traçados a realizar nos anos seguintes: a Linha do Norte, cujo objectivo era ligar as duas maiores capitais do reino e a Linha do Leste, cujo primeiro traçado pretendia numa fase inicial ligar Lisboa a Rossio ao Sul do Tejo (Abrantes), que passaria a ser explorada a 7 de novembro de 1862. A 5 de maio de 1863 chegaria ao Crato e ligaria Fronteira a Elvas a 24 de setembro do mesmo ano.

Esta ligação tinha uma particularidade e revestia-se de uma dificuldade acrescida pela necessidade de uma ponte que cruzasse o Tejo entre Constância e Paio de Pelle (atual Praia do Ribatejo) (5).

A Obra teria a extensão de quase 500 metros e demoraria cerca de ano e meio a ser construída.

A PRIMEIRA PONTE FERROVIÁRIA SOBRE O TEJO NACIONAL

Esta seria também a primeira ponte de utilização ferroviária construída sobre o Tejo, no seu curso nacional.

Consta mesmo que dada a sua importância chegou a ser visitada pelo rei D. Pedro V, em outubro de 1861, praticamente a um mês da sua morte, na fase inicial da sua construção. Seriam necessários 14 meses e cerca de 640 toneladas de ferro laminado, 1150 toneladas de ferro fundido, vindas de Inglaterra. Além do ferro, foram ainda empregues 3250 metros cúbicos de madeira, vencendo-se deste modo os 494 metros entre margens. Em Agosto de 1862, é posta à prova, antes de entrar definitivamente ao serviço em 07 de Novembro desse ano.Esta ponte assentava sobre pilares tubulares de ferro fundido, cravados no leito do rio, mas só metade deles estavam apoiados em rocha, sendo os restantes cravados na areia do leito. Esta circunstância contribuiu desde logo para que a estrutura trepidasse assustadoramente à passagem do comboio, o que fez, logo após a sua conclusão, correr o rumor de que não era segura. As cheias ocorridas em 1876, responsáveis por danos importantes nos cilindros de um dos pilares, viria a ditar a sua substituição nos anos seguintes.


A SUBSTITUIÇÃO DA PONTE

Em resultado dos constantes rumores e alarmes ligados à segurança da estrutura da ponte e das cheias de 1876 que danificaram seriamente um dos pilares, a companhia Portuguesa de Caminhos de Ferro acabou por se decidir pela substituição na íntegra da estrutura, mas só quase 11 anos depois se iniciam as obras da nova estrutura, recorrendo agora a um projeto da Casa Eiffel, tão em voga na época. Assente em pilares de granito e com um desenho metálico de travessas cruzadas a nova ponte começou a ser construída em 1887, terminando as obras em 1890, altura em que entrou finalmente em funções.Sobrevive até aos nossos dias.
DE FERROVIÁRIA A RODOVIÁRIA

Com a construção de uma nova ponte ferroviária, ditada pelas novas necessidades de carga e de segurança ao lado da estrutura existente e sobre um alargamento dos pilares já utilizados, uma nova ponte libertou para outras utilizações a anterior.

Depois de uma adaptação foi transformada em ponte rodoviária, sendo colocada ao serviço das populações em 1988.Foi alvo de obras muito recentemente, bem como objecto de algumas restrições, com vista à sua proteção, pelo que talvez venha a sobreviver mais um século.

BIBLIOGRAFIA

~História do Caminho-de-Ferro - Vida de um ferroviário, de António Reinaldo Mendes - Plátano Editora - 1ª Edição setembro de 2009;
~Histórias do Património do Concelho de Constância - António Matias Coelho, 1999, Edição com o patrocínio da Câmara Municipal de Constância;
~D. Pedro V - Coleção Reis de Portugal do Círculo de Leitores - de Maria Filomena Mónica - Edição de 2005.

Notas retiradas da Wikipédia:

(1) A Guerra Peninsular, também conhecida em Portugal como as Invasões Francesas e em Espanha como Guerra da Independência Espanhola, ocorreu no início do século XIX, entre 1807 e 1814,1 na península Ibérica, e insere-se nas chamadas Guerras Napoleónicas. A princípio, envolveu Espanha e França, de um lado, Portugal e Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda, do outro. Porém, a guerra teve repercussões além da Europa, influindo na independência das colónias da América Latina.
(2) Guerra Civil Portuguesa, também conhecida como Guerras Liberais, Guerra Miguelista ou Guerra dos Dois Irmãos foi a guerra civil travada em Portugal entre liberais constitucionalistas e absolutistas sobre a sucessão real, que durou de 1828 a 1834. Em causa estava o respeito pelas regras de sucessão ao trono português face à decisão tomada pelas Cortes de 1828, que aclamaram D. Miguel I como rei de Portugal. As partes envolvidas foram o partido constitucionalista progressista liderado pela Rainha D.ª Maria II de Portugal com o apoio de seu pai, D. Pedro IV de Portugal, e o partido tradicionalista de D. Miguel I de Portugal e ainda o Reino Unido, a França, a Espanha e a Igreja Católica.
(3) Maria da Fonte, ou Revolução do Minho, é o nome dado a uma revolta popular ocorrida na primavera de 1846 contra o governo cartista presidido por António Bernardo da Costa Cabral.A revolta resultou das tensões sociais remanescentes das guerras liberais, exacerbadas pelo grande descontentamento popular gerado pelas novas leis de recrutamento militar que se lhe seguiram, por alterações fiscais e pela proibição de realizar enterros dentro de igrejas.Iniciou-se na zona de Póvoa de Lanhoso (Minho) uma sublevação popular que se foi progressivamente estendendo a todo o norte de Portugal. A instigadora dos motins iniciais terá sido uma mulher do povo chamada Maria, natural da freguesia de Fontarcada, que por isso ficaria conhecida pela alcunha de Maria da Fonte. Como a fase inicial do movimento insurreccional teve uma forte componente feminina, acabou por ser esse o nome dado à revolta.A sublevação propagou-se depois ao resto do país e provocou a substituição do governo de Costa Cabral por um presidido por D. Pedro de Sousa Holstein, o 1.º Duque de Palmela. Quando, num golpe palaciano, conhecido pela Emboscada, a 6 de Outubro daquele ano, a rainha D. Maria II demite o governo e nomeia o marechal João Oliveira e Daun, Duque de Saldanha para constituir novo ministério, a insurreição reacende-se.O resultado foi uma nova guerra civil de 8 meses, a Patuleia, que apenas terminaria com a assinatura da Convenção de Gramido, a 30 de Junho de 1847, após a intervenção de forças militares estrangeiras ao abrigo da Quádrupla Aliança.
(4) Patuleia,1 ou Guerra da Patuleia, é o nome dado à guerra civil entre Cartistase Setembristas na sequência da Revolução da Maria da Fonte. Foi desencadeada em Portugal pela nomeação, na sequência do golpe palaciano de 6 de Outubro de 1846, conhecido pela Emboscada, de um governo claramente cartista presidido pelo marechal João Oliveira e Daun, Duque de Saldanha.A guerra civil teve uma duração de cerca de oito meses, opondo os cartistas (com o apoio da rainha D. Maria II) a uma coligação contra-natura que juntava setembristas a miguelistas. A guerra terminou com uma clara vitória cartista, materializada a 30 de Junho de 1847 pela assinatura da Convenção de Gramido, mas apenas após a intervenção de forças militares estrangeiras ao abrigo da Quádrupla Aliança.
(5) Praia do Ribatejo é uma freguesia portuguesa do concelho de Vila Nova da Barquinha, com 20,24 km² de área e 1 702 habitantes (2011). Densidade: 84,1 hab/km².Designou-se Paio de Pele até 1920.1 Foi vila e sede de concelho até ao início do século XIX. Era constituído apenas pela freguesia da sede e tinha, em 1801, 773 habitantes.Possui um apeadeiro ferroviário, da Linha da Beira Baixa.

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